" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca
incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se
sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca,
ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e
imunizados. A mínima exposição a determinadas
circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis
recorrências e acabamos por arder na altíssima febre
de uma recidiva sem regresso nem apelo".
Rui Knopfli
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
Eu, Rosie, eu se falasse eu dir-te-ia
Foto Petra Nemcova
Eu, Rosie, eu se falasse eu dir-te-ia Que partout, everywhere, em toda a parte, A vida égale, idêntica, the same, É sempre um esforço inútil, Um voo cego a nada. Mas dancemos; dancemos Já que temos A valsa começada E o Nada Deve acabar-se também, Como todas as coisas. Tu pensas Nas vantagens imensas De um par Que paga sem falar; Eu, nauseado e grogue, Eu penso, vê lá bem, Em Arles e na orelha de Van Gogh... E assim entre o que eu penso e o que tu sentes A ponte que nos une - é estar ausentes.
Reinaldo Ferreira, in "Poemas", Lourenço Marques, Imprensa Nacional de Moçambique, 1960.
Foto Digital no Índico O menino que eu fui debruça-se furtivo de meus olhos sobre o recanto da paisagem. Entre a dureza austera dos prédios e o largo sorriso colorido das vidraças aquele recanto que sobrou da paisagem pertence intacto ao menino que eu fui outrora e o menino que eu fui outrora desce alvoraçado de meus olhos, desliza entre o capim, atira pedras aos galagalas e salta sobre as velhas folhas de zinco apodrecido, num cenário querido de girassóis antigos. Então parto dali e o menino que fui regressa extenuado e adormece na sombra de meus olhos.
Caía a tarde feito um viaduto E um bêbado trajando luto Me lembrou Carlitos...
A lua Tal qual a dona do bordel Pedia a cada estrela fria Um brilho de aluguel
E nuvens! Lá no mata-borrão do céu Chupavam manchas torturadas Que sufoco! Louco! O bêbado com chapéu-coco Fazia irreverências mil Prá noite do Brasil. Meu Brasil!...
Que sonha com a volta Do irmão do Henfil. Com tanta gente que partiu Num rabo de foguete Chora! A nossa Pátria Mãe gentil Choram Marias E Clarisses No solo do Brasil...
Mas sei, que uma dor Assim pungente Não há de ser inutilmente A esperança...
Dança na corda bamba De sombrinha E em cada passo Dessa linha Pode se machucar...
Asas! A esperança equilibrista Sabe que o show De todo artista Tem que continuar...
Foto Digital no Indíco Meu verso cínico é minha terapêutica e minha ginástica. Nele me penduro e ergo, em sua precisão de barra fixa. Nele me exercito em pino flexível, sílaba a sílaba, movimento controlado de pulso, e me volteio aparatoso na pirueta lograda, no lance bem ritmado.
Há um sorriso discreto em minha segurança.
Porém, se às vezes me estatelo, folha seca (o verso é difícil e escorregadio), meu verso, como de vós, ri-se de mim em ar de troça.
Rompe-me o sono um latir de cães na madrugada. Acordo na antemanhã de gritos desconexos e sacudo de mim os restos da noite e a cinza dos cigarros fumados na véspera. Digo adeus à noite sem saudade, digo bom dia ao novo dia. Na mesa o retrato ganha contorno, digo-lhe bom dia e sei que intimamente ele me responde.
Saio para a rua e vou dizendo bom dia em surdina às coisas e pessoas por que passo.
No escritório digo bom dia. Dizem-me bom dia como quem fecha uma janela sobre o nevoeiro, palavras ditas com a epiderme, som dissonante, opaco, pesado muro entre o sentir e o falar.
E bom dia já não é mais a ponte que eu experimentei levantar. Calado, sento-me à secretária, soturno, desencantado.
A 5 de Outubro de 1143 fez-se o Tratado de Zamora entre D. Afonso Henriques e D. Afonso VII, respectivamente Reis de Portugal e de Leão e Castela, em que o segundo reconhecia a soberania de Portugal proclamada pelo primeiro em 1140. É o que hoje se comemora, 866 anos depois.
On a tous dans un cœur une petite fille oubliée Une jupe plissée queue d'cheval à la sortie du lycée On a tous dans un cœur un morceau de fer à user Un vieux scooter de rêve pour faire le cirque dans le quartier Et la p'tite fille chantait Et la p'tite fille chantait Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Locomotion
On a tous dans l'cœur le ticket pour Liverpool Sortie de scène hélicoptère pour échapper à la foule Excuse-me Sir mais j'entends plus Big Ben qui sonne Les scarabées bourdonnent c'est la folie à London Et les Beatles chantaient Et les Beatles chantaient Un truc qui m'colle'encore au cœur et au corps Hard day's night
A quoi ça va me servir d'aller m'faire couper les tifs Est-ce que ma vie sera mieux une fois qu'j'aurais mon certif' Betty a rigolé devant ma boule à zéro Je lui dis si ça te plût pas T'as qu'à te plaindre au dirlo Et je me suis fait virer Et les Beach Boys chantaient Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Get around
On a tous dans un cœur des vacances à Saint-Malo Et des parents en maillot qui dansent chez Luis Mariano Au " Camping des flots bleus ", je me traîne des tonnes de cafard Si j'avais bossé un peu je me serais payé une guitare Et Saint-Malo dormait Et les radios chantaient Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Gloria ,
Au café de ma banlieue t'as vu la bande à Jimmy Ça frime pas mal, ça roule autour du baby Le pauvre Jimmy s'est fait piquer chez le disquaire, c'est dingue Avec un single des Stones caché sous ses fringues Et les loulous roulaient Et les cailloux chantaient Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Satisfaction
Le jour où je vais partir je sens bien que ça va faire mal Ma mère n'aime pas mon blouson et les franges de mon futal Le long des autoroutes il y a de beaux paysages J'ai ma guitare dans le dos et pas de rond pour le voyage Et Bob Dylan chantait Et Bob Dylan chantait Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Mister Tambourine man
Laissez-moi passer j'ai mes papiers mon visa Je suis déjà dans l'avion going to America Même si je reste ici que je passe ma vie à Nogent J'aurai une vieille Chevrolet et dix huit filles dedans Et les Bee Gees chantaient Et les Bee Gees chantaient Massachusetts
Au printemps 66 je suis tombé fou amoureux Ça m'a fait plutôt mal j'avais de l'eau dans les yeux Ma p' tite poupée je t'emmène dans le pays de mes langueurs Elle fait douceur douceur la musique que j'ai dans le cœur Toute la nuit on s'aimait Quand Donovan chantait Un truc qui m'colle encore au cœur et au corps Mellow Yellow
Maintenant j'ai une guitare et je voyage organisé Je me lève tous les jours trop tard Et je vis aux Champs-Elysées Je suis parti je ne sais où mais pas où je voulais aller Dans ma tête y a des trous je me souviens plus des couplets Y a des rêves qui sont cassés Des airs qui partent en fumée Des trucs qui m'colle encore au cœur et au corps California dreaming
" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca
incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se
sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca,
ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e
imunizados. A mínima exposição a determinadas
circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis
recorrências e acabamos por arder na altíssima febre
de uma recidiva sem regresso nem apelo".
Rui Knopfli