" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca
incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se
sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca,
ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e
imunizados. A mínima exposição a determinadas
circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis
recorrências e acabamos por arder na altíssima febre
de uma recidiva sem regresso nem apelo".
Rui Knopfli
sexta-feira, 29 de setembro de 2006
No princípio, só a vida existia
"No princípio, só a vida existia; O mundo era o que havia Ao alcance da vida... E mais nada.
Tudo era certo, simples, claro.
Quando o passado passar (E passará, porque o passado é hoje) E o futuro vier (E há-de vir, porque o futuro é hoje), Então, sim; há-de saber-se tudo E tudo será certo, simples, claro.
Eu, porém, não sei nada."
Reinaldo Ferreira,”Poemas” Livro IV, Dispersos, s.l.
O essencial é ter o vento. Compra-o; compra-o depressa, A qualquer preço. Dá por ele um princípio, uma ideia, Uma dúzia ou mesmo dúzia e meia Dos teus melhores amigos, mas compra-o. Outros, menos sagazes E mais convencionais, Te dirão que o preciso, o urgente, É ser o jogador mais influente Dum trust de petróleo ou de carvão. Eu não: O essencial é ter o vento. E agora que o Outono se insinua No cadáver das folhas Que atapeta a rua E o grande vento afina a voz Para requiem do Verão, A baixa é certa. Compra-o; mas compra-o todo, De modo Que não fique sopro ou brisa Nas mãos de um concorrente Incompetente.
Reinaldo Ferreira , "Poemas"Livro I - Um Voo Cego a Nada
Tu foste o maior tijolo atirado ao meu “muro”, e tentei nos vinte anos seguintes, ensinar-te que a todos os “muros” é necessário atirar os tijolos que os derrubem, para que o limite seja a linha do horizonte. Obrigado!
Não quero lembrar há quanto tempo deixei a ilha de Moçambique! E apesar de tudo, ainda sou a mesma! Filha eterna de quanta rebeldia me sagrou minha segunda Mãe África – Ilha de Moçambique! Minha, eternamente…! Os meus segredos de criança O mar os levou em lembrança e os contou às sereias. Os estilhaços da minha adolescência, Fincaram emulsionados na força da água e incrustaram as conchas do mar. Os projectos da minha juventude ainda estavam a nascer. Longe de ti amadureci. Hoje, Em minhas mágoas e saudade, Vê de que Esperança me mantenho, Da perigosa segurança de a ti voltar. Pois dias há, que na alma tenho, Um não sei quê, que nasce não sei de onde, Vem não sei como e dói não sei porquê. E para aliviar este mal que mata e não se vê No silêncio te escrevo, minha segunda Mãe África – Ilha de Moçambique!
O processo - O que importa é virá-lo do avesso, Mudar as intenções, Interpretar, Sofismar - Deve ser rápido e sumário. Termos, preceitos, norma, É tudo forma, Matéria de processo e convenção. Ao cabo, é o Calvário Que é preciso atingir. Alguém tem de subir. Eu não quis, sou juiz. Aos senhores, Mais propagadores De tudo o que acontece - De todo o que parece Que acontece E passa a acontecer - E disto e daquilo - E da Verdade, às vezes - .......................
" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca
incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se
sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca,
ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e
imunizados. A mínima exposição a determinadas
circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis
recorrências e acabamos por arder na altíssima febre
de uma recidiva sem regresso nem apelo".
Rui Knopfli