Um Voo Cego A Nada...

" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca, ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e imunizados. A mínima exposição a determinadas circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis recorrências e acabamos por arder na altíssima febre de uma recidiva sem regresso nem apelo". Rui Knopfli

terça-feira, 10 de junho de 2008

Prospero's Speech (... em Dia da Raça)




Loreena McKennitt



ILHA DE MOÇAMBIQUE, "ILHA DE PRÓSPERO", "ILHA DE CALIBAN"


Ilha Dourada


A fortaleza mergulha no mar
os cansados flancos
e sonha com impossíveis
naves moiras.Tudo mais são ruas prisioneira
se casas velhas a mirar o tédio.
As gentes calam na voz
uma vontade antiga de lágrima
se um riquexó de sono
desce a Travessa da Amizade.
Em pleno dia claro
vejo-te adormecer na distância,
Ilha de Moçambique,
e faço-te estes versos
de sal e esquecimento.


Rui Knopfli




Ilha de Moçambique


Não é a pedra.
O que me fascina
é o que a pedra diz.

A voz cristalizada,
o segredo da rocha rumo ao pó.


E escutar a multidão

de empedernidos seres
que a meu pé se vão afeiçoando.

A pedra grávida
a pedra solteira,
a que canta, na solidão,
o destino de ser ilha.
O poeta quer escrever
a voz na pedra.

Mas a vida de suas mãos migra
e levanta voo na palavra.

Uns dizem: na pedra nasceu uma figueira.

Eu digo: na figueira nasceu uma pedra.


Mia Couto



Ilha do meu alento, de Moçambique


Sei de cor,

Cada curva do teu corpo,

Os passos dos teus caminhos,

As sombras das tuas árvores e casario.

Sei de cor,

Cada dança das tuas ondas,

As carícias do teu vento,

Os cheiros da tua maresia.

Sei de cor,

Cada tom da cor do teu mar,

O calor e brilho do sol dos teus dias,

O luar e as estrelas das tuas noites.

Sei de cor,

Cada limite do teu horizonte,

A voz das tuas gentes,

A brandura das tuas horas.

Sei de cor,

A imagem do meu tempo.

Neste meu exílio sereno,

Onde tomei tamanho de gente.

Sei de cor,

Cada lágrima do teu rosto,

As angústias do teu olhar,

Os silêncios do tua voz,

A imagem de outro tempo!

E o que não sei de cor

Adivinho a sonhar.

Se me disserem que sou louca,

Logo minha voz com firmeza desmente.

Mas se for, tanto melhor!


MD



Pedras da Minha Terra


Valeu a pena escutar,

Valeu a pena a contemplação,

Das pedras da Minha Terra.

Acomodada num canto da nostalgia

Aqueci-me no manto da infância.

Deixei escorregar as saudades pelas pedras,

Fiz versos com gentil candura,

E reparei, que outrora,

Fabricava sonhos, era feliz e não sabia.

Mas as pedras,

Mostraram-me o avesso da brandura,

A sagrada maldição.

As pedras são tempo.

É nas pedras,

Que o tempo amanhece e esmaece,

É nas pedras que o tempo se escreve.

Em que lugar destas pedras,

Em que tempo distante

Eu me confundi?




MD



(actualizado em 21-06-08)

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2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Tanta tinta corre por esta pérola e ELA cada vez mais velhinha
Se as palavras e a saudade que tantos sentem a pudesse reabilitar, como seria BELA e JOVEM
bj
MD

segunda-feira, 16 de junho de 2008 às 22:23:00 WEST  
Blogger fsa said...

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domingo, 27 de maio de 2012 às 14:54:00 WEST  

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