Advertência
Mas estamos convencidos que o mito é uma linguagem, um meio de expressão – quero dizer, não uma coisa arbitrária mas antes um viveiro de símbolos a que pertence, tal como a todas as linguagens, uma particular substância de significado que mais nada poderia dar. Quando repetimos um nome próprio, um gesto, um prodígio mítico, exprimimos em meia linha, em poucas sílabas, um facto sintético e compreensivo, um miolo de realidade que vivifica e alimenta todo um organismo de paixão, de estado humano, todo um conjunto conceptual. Se depois este nome, este gesto nos for familiar desde a infância, desde a escola – tanto melhor. A inquietude é mais verdadeira e cortante quando agita uma matéria costumeira. Aqui contentámo-nos em servir-nos de mitos helénicos dada a perdoável voga popular destes mitos, dada a sua imediata e tradicional aceitabilidade. Temos o horror de tudo o que é incomposto, heteróclito, acidental, e tentamos – até materialmente – delimitar-nos, impor-nos a nós próprios uma moldura, insistir numa concluída presença. Estamos convencidos de que uma grande revelação só poderá sair da teimosa insistência numa mesma dificuldade. Não temos nada em comum com os viajantes, com os experimentadores nem com os aventureiros. Sabemos que o modo mais seguro – e mais rápido – de nos espantarmos é fixarmos impávidos o mesmo objecto. Num belo momento, este objecto parecer-nos-á – miraculoso – que nunca o tínhamos visto.
Etiquetas: Cesare Pavese
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