Um Voo Cego A Nada...

" Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca, ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e imunizados. A mínima exposição a determinadas circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis recorrências e acabamos por arder na altíssima febre de uma recidiva sem regresso nem apelo". Rui Knopfli

segunda-feira, 23 de março de 2009

Queda



E eu que sou o rei de toda esta incoerência,

Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la

E giro até partir ... mas tudo me resvala

Em bruma e sonolência.

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de oiro,

Volve-se logo falso ... ao longe o arremesso...

Eu morro de desdém em frente dum tesoiro,

Morro á mingua, de excesso.



Alteio-me na cor à força de quebranto,

Estendo os braços de alma – e nem um espasmo venço!...



Peneiro-me na sombra – em nada me condenso...

Agonias de luz eu viro ainda entanto.



Não me pude vencer, mas posso-me esmagar,

vencer às vezes é o mesmo que tombar –

e como inda sou luz, num grande retrocesso,

em raivas ideais ascendo até ao fim:

olho do alto o gelo, ao gelo me arremesso ...



Tombei ....



E fico só esmagado sobre mim !...


Mário de Sá-Carneiro

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